A MINHA É MELHOR QUE A TUA!

A MINHA É MELHOR QUE A TUA!

Por: Drª Clara Paredes de Castro

 

 

- A minha é melhor que a tua…

- Pois, mas a minha tem um telhado cor de rosa e a tua não!

 

Estão a ver aqueles diálogos da creche? É o que eu sinto quando vejo os rankings da escola. Era resumir isto num diálogo de crianças com 5 anos e estava feito! Pelo meio pediam para eles descreverem essa coisa linda que são os quadros de mérito e de excelência, as quotas dos professores. Tudinho... ali, num diálogo “a tua é maior que a minha”. Pronto!

 

É que isto não parece de adultos, senhores. Não num universo como o nosso, não num sistema que ainda não é igualitário, não quando ainda falta tudo num lado e sobra muito do outro, não enquanto não há trabalho entre público e privado, não enquanto há turmas enormes e turmas pequenas, não enquanto não há estabilidade do corpo docente. Não! Não se compare o incomparável, não se condenem escolas às “minorias” (palavra linda por sinal), aos “desfavorecidos” (outra), à população com dificuldades socio económica (mais uma), aos “menos capazes” (nem comento!) Não. Não se atribua à nota, o sinónimo de sucesso.

 

Que não se permita que um bom aluno não tenha espaço em escolas que tem uma pontuação baixa, porque os pais o mandam andar 40 km acima, para ir atrás de um ranking que o levará do 17 ao 19,99 à custa de muito desgaste… de esforço, dedicação, é certo, mas com consequências emocionais e relacionais. “Porque a competitividade ganha-se desde pequenino e eles assim aprendem como é duro lutar por boas notas, para se ter sucesso na vida!!”. A única frase de jeito que conheço que meta “pequenino” é a do pepino e nunca percebi a parte de torcer.

 

Num exercício puro e duro de análise matemática a malta pega da folha de cálculo e é mais ou menos isto. As escolas de ranking elevado, que até têm programas de mentoring e coaching, e ações em prol do ambiente e da solidariedade, eles cantam, tocam, dançam e fazem tudo bem, numa balança de perfeição onde não há espaço para a falha. Não sei em que parte é que deixaram de ser alunos, mas tenho alguma certeza que algo se perde ali pelo meio. Porque estão agregados no universo dos escolhidos e pasme-se, são uma pré elite. Que um dia será elite. Orgulho…. “A minha é maior que a tua.” A nota, entenda-se.

 

Na outra ponta da lista de excel estão “os outros”. A “plebe” da linha de baixo que desde cedo vai ter de aprender a olhar para cima! Porque se há espaço para bullying, assédio, racismo, homofobia, então dizem-lhes desde cedo, que não há espaço para mais….

 

E ainda há os do meio! Aqueles dos “nim”, os que olham para cima e para baixo e tanto se lhes dá. Nem lhes é exigido que tentem chegar aos 19, nem têm de fugir de cuspidelas e murraças. Uma espécie de classe média dos alunos.

 

Análise feita! Com factos, dizem… Números!! E no meio de tudo isto esquecemos a missão da escola, a única, a que é só daquela, de cada uma. Das que lutam para sobreviver em zonas difíceis, das que misturam culturas, das que inovam, das que expandem recreios, das que brincam e riem, das que choram, mas não desistem, das que se importam em ser escola. Das que querem apostar no ranking das emoções.

 

Em que parte é que permitimos que isto passasse a ser assim? 20 anos de rankings?? A escola de Roberto Carneiro era tão mais inspiradora! Agora uns quantos querem reduzi-la a uma folha de cálculo com “+” e “–“ entre “(“ e “)” e que criam “exceções” e que são “=” a… nada! Pronto. Deu para perceber que não concordo com estes rankings? É só porque não são justos, não são fidedignos, não dizem nada sobre o que de mais importante há na escola: A PESSOA! E aqui não estou a falar só do aluno, mas da Pessoa Auxiliar, a Pessoa Professor, a Pessoa Pai e Mãe, a Pessoa Técnico, a Pessoa Diretor. Essa PESSOA! A que luta e enfrenta dificuldades para criar espaços de aprendizagens felizes, a pessoa que crê que não é o ambiente que vai fazer tudo e que a “aldeia” educativa pode fazer a diferença, a pessoa que olha desde cá de baixo da folha de cálculo e diz “Estou orgulhosamente a tentar!”. Sim, a vida não é só sobre conseguir, é muito sobre tentar, ir, procurar, ceder, avançar, recuar. Isto ensina-se em todas as linhas do ranking, senhores! Ou deveria…

 

Aos que figuram no topo, antes de me começarem a elencar as razões que provam que eu posso estar enganada, eu sei… obrigada! Já obtive essa informação… O erro faz parte da aprendizagem e, se por alguma razão, conseguem ser exceção, nesta senda louca da criação de pequenos “génios-fazedores-de tudo”, aqui ficam as minhas sinceras desculpas. É que eu andei numa escola que está, neste momento, em 466º lugar. Ora bolas! Até que nem me dei mal na vida e acima de tudo, fui muito feliz a olhar de baixo para cima!

Clara Paredes Castro