EDUCAÇÃO, CIDADANIA E COMUNIDADE
EDUCAÇÃO, CIDADANIA E COMUNIDADE
(Breve Apontamento)
Por: Juiz Conselheiro Álvaro Laborinho Lúcio
Neste tempo de imensos e numerosos desafios, marcado pela complexidade e pela incerteza, pela diversidade e pelo risco, a Educação e a Escola surgem-nos, ao mesmo tempo, apontadas como esperança e problema o que, só por si, impõe que chamemos, na busca da solução, toda a comunidade educativa, entendida, esta, como «sistema ecológico formado pela escola, as famílias, os bairros envolventes, as relações de vizinhança e instituições locais com responsabilidade na educação das crianças e dos jovens».
Aí caberá instalar um debate profundo, informado e crítico, desde logo, sobre a natureza daqueles desafios e a forma de os enfrentar e vencer.
Perante a complexidade, urge fazer suceder, a uma tradicional e ilusória lógica de redução, uma outra, agora de compreensão e integração da própria complexidade, em toda a sua amplitude e significado. Só assim – parece - será possível considerar a diversidade, a incerteza e o risco como características saudáveis dos novos tempos, a reclamarem compromisso e acão capazes de combater a indiferença, e afirmando-se como manifestações de uma cidadania responsável.
A realidade, hoje, aberta e mutável, reclama mais e melhor conhecimento, pressuposto indispensável de uma verdadeira autonomia pessoal. Autonomia que, identificando a pessoa/sujeito, lhe reconheça poder, e se identifique, ela própria, como resposta às questões levantadas pela complexidade, pela incerteza e pelo risco.
Entretanto, perante a diversidade e a autonomia do sujeito, que na sua projeção política, implicam liberdade e democracia, surge, como contraponto, o risco de exclusão social, como forma de desvio, a impor agora a necessidade de cooperação e solidariedade, como instrumentos de relação humana, de reconhecimento do outro e de realização social.
Por aqui, será possível acordar num desígnio para a Educação, dela reclamando capacidade e competência para formar, na complexidade e na diversidade, para a autonomia, para a cooperação e para a solidariedade.
E, aí, algumas opções é necessário fazer.
Por um lado, entre um modelo funcional, que privilegia a competência para agir ou o saber fazer; e um modelo global, que aposta, além daquela, na competência para pensar e na competência para escolher, só este último parece poder corresponder à exigência de uma educação para a autonomia.
Por outro lado, entre um modelo que privilegia a inclusão e um outro que certifica a exclusão, as novas questões trazidas pela massificação do ensino não podem fazer hesitar, sendo que apenas o primeiro responde às exigências de uma solidariedade imposta pelo cumprimento, por parte do Estado, do dever de garantia de uma coesão social mínima entre os seus concidadãos.
Ao dar conteúdo a um moderno conceito de cidadania, a par de outros requisitos, a socióloga francesa, Dominique Schnapper, sublinha a afirmação do direito de cada um exercer concretamente os seus direitos, daí fazendo decorrer a imposição de proporcionar a todos as capacidades intelectuais e cognitivas necessárias para participar realmente na vida pública, social, económica, cultural e política. Ora, a ser assim, como é, daqui resulta evidente a importância da Escola! Afinal, que outro verdadeiro objetivo, que não este, para convocar a intencionalidade última que liga Educação e Escola?
Porém, porque de capacidades se trata, o primeiro esforço há-de ser dirigido à identificação destas, em cada aluno, e ao correspondente desenvolvimento, assim sobressaindo a importância do relevo a conceder à cultura da criança e do jovem e ao respeito por esta como referência do modelo educativo e como metodologia marcada também por exigências de eficácia estruturada na melhor expectativa de adesão dos alunos, pressuposto fundamental de uma aprendizagem bem-sucedida.
E aqui regressa o relevo a conceder ao papel da Comunidade Educativa.
Aos professores pode pedir-se muito. E pede-se. Mas não pode pedir-se tudo. Por isso, cabe reclamar uma intervenção em rede envolvendo, conforme os casos, a Família, a Escola, os Serviços de Saúde, de Justiça, de Segurança Social, Coletividades, Empresas, Movimentos Culturais, Artísticos e Sociais e Responsáveis Políticos aos vários níveis do Poder, tendo como base comum global, um compromisso de cooperação e corresponsabilização. Sem Escola, renega-se o objetivo de uma inclusão universal; sem Educação, nega-se a própria condição humana.
Trata-se, pois, de fazer coincidir, na Escola, objetivos, que só a partir da sua convergência, podem definir um perfil de Educação a promover. Uma Educação que, não recusando jamais o valor inestimável das competências que ensina e faz aprender, não esqueça também a dimensão cognitiva, ética e social que cada uma delas pressupõe e sem as quais é a própria Educação a negar-se a si mesma.
Álvaro Laborinho Lúcio
4 de Fevereiro de 2021